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domingo, 30 de agosto de 2020

Aventuras de Pedro Malasartes, visita ao céu e ao inferno.



Um dia chegou para Malasartes a hora de ir para o outro mundo, e de nada lhe valeu a esperteza; teve que marchar.
Quando se viu no estradão da eternidade, pensou no que faria e resolveu, em primeiro lugar, ir bater à porta do céu.
Lá foi; mas São Pedro, assim que o enxergou, deu-lhe com a porta na cara. Então deliberou ir ao inferno; foi, bateu, mas o porteiro, dando com o homem que surrava até os diabos, tratou de fechar o portão com quantas trancas havia e foi correndo avisar o seu rei.
Houve um rebuliço dos diabos no inferno: pavor e correrias por todos os cantos. 


O próprio Satanás tremeu; mas, recuperando o sangue frio, pensou, pensou e ordenou que se deixasse entrar o hóspede. E disse-lhe:
- Eu não quero você no inferno, Malasartes; você, além do que já fez, ainda é capaz de vir aqui revolucionar a minha gente.
– Tenha paciência, seu Satanás, mas aqui estou e aqui fico.
– Então vou fazer uma proposta: que se decida o seu destino pela sorte do jogo. Aceita?
- Feito!
- Se você perder irá direitinho para o caldeirão.
– Está dito. E se eu ganhar, você me paga com uma das almas que lá estão fervendo.
Começaram o jogo, e cada qual fazia o possível para passar a perna no outro. Mas Pedro Malasartes era mais esperto e ganhou a primeira partida, depois a segunda e assim outras. Satanás, vendo que não podia derrotar o parceiro e que ia perdendo almas sobre almas, postas em liberdade por Malasartes, mandou botar o insuportável para fora do inferno.
Malasartes andou vagando como alma penada, muito tempo, sem saber onde havia de se aboletar. Até que um dia teve uma ideia e tocou de novo para o céu. 


Chegando à porta do céu, tomou uns ares muito humildes, e bateu devagarinho. São Pedro abriu um postigo, enfiou a cabeça e perguntou:
- Quem bate a estas horas?
- Sou eu, meu santo…
- Eu, quem? Diga o que quer, e toca!
- Será possível que o meu santo padroeiro não me reconheça… Pois eu sou o Pedro Malasartes.
– Malasartes?! Outra vez?! Já não lhe disse que o seu lugar não é aqui?
- Não se zangue meu santo, meu grande santo… Sei muito bem que nunca entrarei neste lugar de glória…
- Então vamos ver, o que quer?
Malasartes, com muita brandura e muita lábia, pediu ao santo que entreabrisse ao menos a porta, um bocadinho, só para que pudesse espiar por um momento a beleza do céu. Tanto pediu e tanto fez que São Pedro o atendeu. Então, mais que depressa Malasartes atirou o chapéu pela fresta.
São Pedro bufou e descompôs o patife, e tanto barulho fez que começaram a ajuntarem-se magotes de anjos e de justos ali junto da porta.
Acontece que o chapéu era um objeto terreno, além de estar muito sujo, e ninguém no céu lhe podia tocar. Mas Pedro Malasartes reclamava o chapéu, não abria mão, e enfim, para encurtar, não houve jeito senão, permitir-lhe que entrasse.
E o malandro, entrou muito contente, com ar vitorioso.
Mas o atrevimento não ficou sem castigo. Levaram o tal para junto de um monte enorme de milho e mandaram-no contar os grãos um por um. Malasartes, que remédio! Começou a contar, a contar, a contar, e levou um mundo de tempo a amontoar os grãozinhos para um lado. Quando já estava acabando a contagem, veio um anjo e misturou tudo. E Malasartes teve de contar de novo… E até hoje lá está contando e recontando os grãos de milho, sem acabar nunca.

Fonte: Focalizadora

Professora Vera Lúcia Ravagnani - vl.ravagnani@uol.com.br

As historinhas de Pedro Malasartes fazem parte do folclore, sendo que muitas origens são atribuídas ao personagem, um rapaz que nos moldes brasileiros seria um matuto muito esperto capaz de ganhar de qualquer um apenas usando seus artifícios. 
É um personagem fascinante, aqui começo uma série de suas histórias que são contadas através das gerações.
O conto escolhido para hoje tem muitos ensinamentos, cabe ao professor ou cuidador da criança salientar os que julga mais importantes.

Não esquecer sobre a importância da contação de histórias na formação infantil. Para saber mais sobre contação de histórias clique AQUI  e  AQUI

Sobre Pedro Malasartes saiba mais: https://escola.britannica.com.br/artigo/Pedro-Malasartes/483447

Moral da história: Não vale a pena usar a esperteza, mas dizer a verdade sempre e ser honesto.


Educai as crianças para que não seja necessário punir os adultos.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

Tio Barnabé. Pedrinho procura informações sobre o Saci.




Tio Barnabé era um negro de mais de oitenta anos que morava no rancho coberto de sapé lá junto da ponte.
Pedrinho não disse nada a ninguém e foi vê-lo. Encontrou-o sentado, com o pé direito num toco de pau, à porta de sua casinha, aquentando sol.
—Tio Barnabé eu vivo querendo saber duma coisa e ninguém me conta direito. Sobre o saci. Será mesmo que existe saci?
O negro deu uma risada gostosa e, depois de encher de fumo picado o velho pito, começou a falar:
— Pois, Seu Pedrinho, saci é uma coisa que eu juro que "exéste". Gente da cidade não acredita — mas "exéste". A primeira vez que vi saci eu tinha assim a sua idade. Isso foi no tempo da escravidão, na Fazenda do Passo Fundo, que era do defunto Major Teotônio, pai desse Coronel Teodorico, compadre de sua avó, Dona Benta. Foi lá que vi o primeiro saci. Depois disso, quantos e quantos!...
— Conte, então, direitinho, o que é o saci. Bem tia Nastácia me disse que o senhor sabia — que o senhor sabe
tudo...
— Como não hei de saber tudo, menino, se já tenho mais de oitenta anos? Quem muito "véve", muito sabe...
— Então conte. Que é, afinal de contas, o tal saci?
E o negro contou tudo direitinho.
— O saci — começou ele — é um diabinho de uma perna só que anda solto pelo mundo, armando reinações de toda sorte e atropelando quanta criatura existe. Traz sempre na boca um pito aceso, e na cabeça uma carapuça vermelha. A força dele está na carapuça, como a força de Sanção estava nos cabelos. Quem consegue tomar e esconder a carapuça de um saci fica por toda vida senhor de um pequeno escravo.
— Mas que reinações ele faz? — indagou o menino.
— Quantas pode — respondeu o negro. — Azeda o leite, quebra a ponta das agulhas, esconde as tesourinhas de unha, embaraça os novelos de linha, faz o dedal das costureiras cair nos buracos, bota moscas na sopa, queima o feijão que está no fogo, gora os ovos das ninhadas. Quando encontra um prego, vira ele de ponta pra riba para que espete o pé do primeiro que passa. Tudo que numa casa acontece de ruim é sempre arte do saci. Não contente com isso, também atormenta os cachorros, atropela as galinhas e persegue os cavalos no pasto, chupando o sangue deles. O saci não faz maldade grande, mas não há maldade pequenina que não faça.
— E a gente consegue ver o saci?
— Como não? Eu, por exemplo, já vi muitos. Ainda no mês passado andou por aqui um saci mexendo comigo — por sinal que lhe dei uma lição de mestre...
— Como foi? Conte...
Tio Barnabé contou.
— Tinha anoitecido e eu estava sozinho em casa, rezando as minhas rezas. Rezei, e depois me deu vontade de comer pipoca. Fui ali no fumeiro e escolhi uma espiga de milho bem seca. Debulhei o milho numa caçarola, pus a caçarola no fogo e vim para este canto picar fumo pro pito.
Nisto ouvi no terreiro um barulhinho que não me engana.
"Vai ver que é saci!" — pensei comigo. — E era mesmo. Dali a pouco um saci preto que nem carvão, de carapuça vermelha e pitinho na boca, apareceu na janela. Eu imediatamente me encolhi no meu canto e fingi que estava dormindo. Ele espiou de um lado e de outro e por fim pulou para dentro. Veio vindo, chegou pertinho de mim, escutou os meus roncos e convenceu-se de que eu estava mesmo dormindo. Então começou a reinar na casa. Remexeu tudo, que nem mulher velha, sempre farejando o ar com o seu narizinho muito aceso. Nisto o milho começou a chiar na caçarola e ele dirigiu-se para o fogão. Ficou de cócoras no cabo da caçarola, fazendo micagens. Estava "rezando" o milho, como se diz. E adeus, pipoca! Cada grão que o saci reza não rebenta mais vira piruá.
Dali saiu pra bulir numa ninhada de ovos que a minha carijó calçuda estava chocando num balaio velho, naquele canto. A pobre galinha quase que morreu de susto. Fez cró, cró, cró... E voou do ninho feito uma louca, mais arrepiada que um ouriço-cacheiro. Resultado: o saci rezou os ovos e todos goraram.
Em seguida pôs-se a procurar o meu pito de barro
Achou o pito naquela mesa, pôs uma brasinha dentro e paque, paque, paque... Tirou justamente sete fumaçadas. O saci gosta muito do número sete.
Eu disse cá comigo: “Deixe estar, coisa-ruinzinho, que eu ainda apronto uma boa para você”. Você há de voltar outro dia e eu te curo."
E assim aconteceu. Depois de muito virar e mexer, o sacizinho foi-se embora e eu fiquei armando o meu plano para assim que ele voltasse.
— E voltou? — inquiriu Pedrinho.
— Como não? Na sexta-feira seguinte apareceu aqui outra vez às mesmas horas. Espiou da janela, ouviu os meus roncos fingidos, pulou para dentro. Remexeu em tudo, como da primeira vez, e depois foi atrás do pito que eu tinha guardado no mesmo lugar. Pôs o pito na boca e foi ao fogão buscar uma brasinha, que trouxe dançando nas mãos.
— É verdade que ele tem as mãos furadas?
— É, sim. Tem as mãos furadinhas bem no centro da palma; quando carrega brasa, vem brincando com ela, fazendo ela passar de uma para a outra mão pelo furo.
Trouxe a brasa, pôs a brasa no pito e sentou-se de pernas cruzadas para fumar com todo o seu sossego.
— Como? — exclamou Pedrinho arregalando os olhos. —
Como cruzou as pernas, se saci tem uma perna só?
— Ah, menino, mecê não imagina como saci é arteiro!...
Tem uma perna só, sim, mas quando quer cruza as pernas como se tivesse duas! São coisas que só ele entende e ninguém pode explicar. Cruzou as pernas e começou a tirar baforadas, uma atrás da outra, muito satisfeito da vida. Mas de repente, puff! Aquele estouro e aquela fumaceira! ... O saci deu tamanho pinote que foi parar lá longe, e saiu ventando pela janela a fora.
Pedrinho fez cara de quem não entende.
— Mas que puff foi esse? — perguntou. — Não estou entendendo...
— Ê que eu tinha socado pólvora no fundo do pito — exclamou tio Barnabé dando uma risada gostosa. A pólvora explodiu justamente quando ele estava tirando a fumaçada número sete, e o saci, com a cara toda sapecada, raspou-se para nunca mais voltar.
— Que pena — exclamou Pedrinho. — Tanta vontade que eu tinha de conhecer esse saci...
— Mas não há só um saci no mundo, menino. Esse lá se foi e nunca mais aparece por estas bandas, mas quantos outros não andam por aí? Ainda na semana passada apareceu um no pasto de Seu Quincas Teixeira e chupou o sangue daquela égua baia que tem uma estrela na testa.
— Como é que ele chupa o sangue dos animais?
— Muito bem. Faz um estribo na crina, isto é, dá uma laçada na crina do animal de modo que possa enfiar o pé e manter-se em posição de ferrar os dentes numa das veias do pescoço e chupar o sangue, como fazem os morcegos. O pobre animal assusta-se e sai pelos campos na disparada, correndo até não poder mais. O único meio de evitar isso é botar bentinho no pescoço dos animais.
— Bentinho é bom?
— É um porrete. Dando com cruz ou bentinho pela frente, saci fede enxofre e foge com botas-de-sete-léguas.
Por hoje já descobrimos bastante sobre o Saci, mas tem muitas histórias ainda, Pedrinho não vai desistir, aguardem...

Autor Monteiro Lobato agora em Domínio Público. 

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