PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC/SP
David Sergio Hornblas Bullying na Escola:
Como crianças lidam e reagem diante de apelidos pejorativos
Mestrado em Educação: Psicologia da Educação –
Material disponível gratuitamente na internet.
CAPÍTULO 1 –
INTRODUÇÃO
1.1 O QUE É BULLYING?
Bullying é uma palavra (expressão) de origem inglesa, adotada em muitos
países para definir o desejo deliberado de maltratar outra pessoa e colocá-la
sob tensão. A expressão foi construída a partir do substantivo bull – touro em
inglês – e por derivação bully (ou
bullie), com alguns significados tais fortão, tirano, valentão e
briguento (corruptela para gíria). Termo
que envolve comportamentos antissociais – preferencialmente nas escolas –
utilizado pela literatura psicológica nos estudos sobre a violência (Olweus,
1999)3. O termo Bully como substantivo, é traduzido por valentão, briguento, tirano
etc., e como verbo, brutalizar, tiranizar, amedrontar etc. (Fante, 2005). Ainda
como substantivo, bullying é definido como um subconjunto de comportamentos
agressivos, sendo caracterizado por sua natureza repetitiva e por desequilíbrio
de poder. Esses critérios nem sempre são aceitos como universais, mesmo sendo
largamente empregados. Alguns pesquisadores consideram serem necessários no
mínimo três ataques contra a mesma vítima durante o ano, para sua identificação
como bullying (Olweus, 1993). Há desproporção de força, onde o desequilíbrio de
poder caracteriza-se pela incapacidade da vítima de se defender: ser mais
jovem, menor estatura ou força física; apresentar pouca habilidade de defesa;
falta de assertividade e pouca flexibilidade psicológica perante o autor ou
autores dos ataques (Fante, 2005). Ainda como verbo, bullying pode ser
traduzido como intimidar, agredir, apelidar, ofender, fazer gozações, encarnar,
humilhar, causar sofrimento, discriminar, excluir, isolar, ignorar, intimidar,
perseguir, assediar, aterrorizar, dominar, agredir, bater, 18dar chutes, dar
empurrões, causar ferimentos, roubar e ainda quebrar pertences (Fante, 2005).
Assim, por convergência entre autores (Fante, 2005; Olweus, 1983; Catini, 2004
e Guareschi, 2008), bullying é definido como um conjunto de atitudes violentas,
intencionais e repetitivas que ocorrem sem motivação aparente, adotado por um
ou mais alunos contra outro(s) causando dor, angústia e sofrimento físico ou
psicológico, Insultos, intimidações, apelidos cruéis, gozações que magoam
profundamente, acusações injustas, fofocas, atuação de grupos que hostilizam,
ridicularizam e infernizam a vida de outros alunos levando-os à exclusão, além
de danos físicos, morais e materiais, são algumas das manifestações do
comportamento de bullying. Portanto, as quatro características sempre
frequentes nos episódios de bullying segundo Olweus (1993) são: 1.
Comportamento violento 2. Produção de
danos 3.
Ações repetidas e continuadas com o passar do tempo 4. Relação
interpessoal caracterizada por um desequilíbrio de poder ou força. O fenômeno
bullying não é novo, por se tratar de uma forma de violência que sempre existiu
nas escolas onde valentões ou briguentos
oprimem suas vítimas por motivos banais e de forma sutil, sendo percebida por uma
significativa parcela de professores, coordenadores e diretores que pouco
fazem, seja por omissão deliberada, seja em decorrência das ameaças às quais
também são frequentemente reféns. No entanto, o estudo aprofundado do bullying
é recente4 e tem sido objeto de investigação e estudos nas últimas décadas,
despertando a atenção da sociedade para suas consequências nefastas, já que se
evidenciam pela desigualdade entre iguais, resultando num processo em que
“valentões” projetam, algumas vezes, sua 19agressividade com requintes de perversidade
e, por vezes de forma oculta, dentro do contexto escolar. O bullying é um tipo
de comportamento, em que os mais fortes convertem os mais frágeis em objetos de
diversão e prazer através de brincadeiras que disfarçam o propósito de
maltratar e intimidar (Olweus, 1999) e pode ocorrer de diversas formas. As mais
comuns, segundo Olweus (1983) são: 52% apelidos pejorativos e discriminatórios
21% ameaças (reais e/ou virtuais) 12% furtos de pertences 9% agressões físicas
5% exclusões do grupo O bullying é um fenômeno universal e os educadores devem
estar atentos – dentro dos limites da função e da instituição – à identificação
de agressores e agredidos, tendo em vista que estes últimos podem apresentar
comportamentos que trafegam desde a angústia e sofrimento intensos até a
violência fatal. Os episódios constantes de violência aguda (com graves lesões
e mortes) nas escolas de ensino médio, universidades americanas, européias e
asiáticas, podem ter explicação no bullying. Alguns dos agressores além de
apresentar demandas psicopatológicas estruturais, sinalizam indícios de terem
sido vitimados por episódios de bullying em uma determinada fase da vida
escolar. Dan Olweus – importante estudioso do fenômeno bullying na Escandinávia
– não estabeleceu relação entre jovens vitimizados pelo bullying e condição
socioeconômica, ao sugerir que situações semelhantes ocorrem em todas as
categorias sociais. Ele atribui este achado à homogeneidade relativa nos países
escandinavos onde seus estudos foram conduzidos. No início dos anos 70, Olweus
iniciou seus suas investigações nas escolas, embora não se verificasse um real
interesse das instituições sobre o assunto.
20No entanto, diante de situações agudas,
ocorridas na década de 80 – três rapazes entre 10 e 14 anos, cometeram suicídio
(Olweus, 1993) – um maior interesse das instituições de ensino para o problema
começou a ser despertado. Olweus pesquisou inicialmente cerca de 84.000
estudantes, 300 a 400 professores e 1.000 pais entre os vários períodos de
ensino, concluindo que 28% dos jovens em idade escolar sofreram alguma ação
intimidatória. Um fator essencial para a pesquisa, visando à prevenção do
bullying, foi conhecer com profundidade,
sua natureza e frequência. Como as técnicas de observação direta ou indireta
são demoradas, o procedimento adotado foi a utilização de questionários. Estes
serviram para caracterizar e avaliar a dimensão do bullying, além de melhor
entender o impacto das intervenções já adotadas. Nos estudos noruegueses
desenvolvidos por Olweus (1983), utilizou-se um questionário composto por 25
questões do tipo múltipla escolha5 Com este instrumento foi possível verificar
a frequência, tipos de agressão e agressores, locais de maior risco, dentre
outras informações para compreensão do bullying. No entanto, Olweus (1983)
presume que, em outros países, como os Estados Unidos – onde a estratificação
social é mais evidente, assim como o fluxo migratório enlaçando culturas
diferentes – as ocorrências de bullying podem estar mais intensamente
relacionadas aos indicadores socioeconômicos, embora nenhum padrão tenha sido
encontrado que relacione alunos vitimizados e, por exemplo, renda familiar. Um
estudo feito pela UNESCO com estudantes entre 14 e 19 anos de cinco capitais
brasileiras (Brasília, Fortaleza, Curitiba, Rio de Janeiro e São Paulo) apontou
que 60% deles disseram ter sido vítimas de algum tipo de violência (física ou
moral) dentro da escola (Abramovay, M. & Rua, 2003). Especialistas e
educadores de todo mundo, com o apoio de instituições públicas e privadas, têm
proposto às autoridades educacionais a criação de programas especiais de
prevenção e combate e ao bullying nas escolas.
Diversas
pesquisas e programas de intervenção6 têm sido desenvolvidos na Europa, América
do Norte e também no Brasil, visando principalmente conscientizar a comunidade
escolar sobre o fenômeno e sensibilizá-la sobre a importância do apoio às vítimas,
da necessidade de extinção do problema, além da implantação de programas de
prevenção. O educador é uma espécie de terceira visão neste processo
silencioso, temperado pelo sofrimento das vítimas que frequentam salas de aula,
corredores e pátios de recreação. Assim, a sociedade civil deverá ter seu
quinhão de responsabilidade na construção de modelos e procedimentos para
controle e extinção do bullying. Em uma decisão judicial inédita, dois
adolescentes de classe média, de 15 e 16 anos, foram obrigados a prestar
serviços comunitários por seis meses, por terem sido acusados de apelidar e
insultar uma colega de classe em uma escola particular de Ribeirão Preto (313
km de São Paulo). Eles foram também acusados de divulgar os insultos na
internet (Coisse, 2008). A vítima, uma garota de 15 anos, disse à promotoria
que os insultos começaram há três anos. Um dos garotos colocou-lhe o apelido de
bode, mas ela afirmou que os xingamentos iam além: fedida, retardada, idiota,
monga e esterco. Ao promotor de justiça local, a estudante afirmou que, “...
além de a rotularem de bode, passaram a fazer barulhos com a boca, simulando
berros do animal nas aulas...". No início do ano letivo, a vítima reclamou
ao pai que continuava a ser ofendida. Ele foi à escola e depois registrou um
boletim de ocorrência (BO) por injúria. A decisão de aplicar a prestação de
serviços foi do juiz da Infância e Juventude em audiência com os acusados e
seus pais. O juiz concedeu remissão judicial, um perdão para evitar que o
processo por injúria prosseguisse. Na ocasião a mídia anunciava: A prática de
constranger colegas por xingamentos ou violência física é conhecida pelo nome
de bullying (Coisse, 2008) Por outro lado, a mãe do menino de 15 anos – da
mesma forma o jornalista que subscreveu a matéria – disse que aceitou o acordo
na Justiça para que a história tivesse fim (SIC), mas achou um exagero que a
situação tenha terminado em uma audiência, declarando: “... Não vou dar razão
para o meu filho, ele errou, mas apelido é uma coisa normal, é só levar na
brincadeira...” (SIC) Vários episódios de bullying são minimizados e seus desdobramentos
considerados pouco importantes na vida do jovem agredido. Para este estudo, foi
considerado especificamente o uso de apelidos pejorativos. Uma maior atenção sobre esses eventos que
alguns consideram aparentemente inofensivos deveria servir como elementos de
reflexão visando à implantação de programas de prevenção e extinção a médio e
longo prazo, ou seja, ações antibullying. Na escola, alunos intimidando alunos,
professores, funcionários e diretores compõem uma realidade de difícil manejo,
compreensão e intervenção. Violência e bullying são comportamentos expressamente
manifestos, mensuráveis e modificáveis. Contudo, os processos mentais
envolvidos são de complexa verificação experimental e portanto, devem compor
uma análise multifatorial, levando em conta fatores biologicamente determinados
e o processo histórico que explica agressividade e violência. Assim sendo, a
psicogênese de Henri Wallon, que contempla fatores genéticos e influências
sociais, oferece respostas consistentes no entendimento dos fenômenos aqui
apresentados. O foco deste estudo foi o comportamento observável – adquirido ou
herdado – e não as inferências e interpretações decorrentes das intrincadas
relações do ser com o mundo. Algumas culturas são mais agressivas que outras,
incentivando competitividade, determinação e tomada de decisão. Outras são mais
passivas, cordatas e menos estimuladoras da competição entre seus pares. Isso
significa que, sob condições específicas, determinados comportamentos se fazem
mais ou menos presentes.
23Nas sociedades mais utilitaristas, o
fenômeno se agrava. Pela pressão do consumo, alguns jovens em especial, não
medem esforços para alcançar seus objetivos, sejam eles legais ou ilegais. Nos
países com índices de desigualdade mais acentuados, o problema parece ser mais
grave, embora Olweus (1980) não tenha identificado relação entre condição
socioeconômica e bullying. Esse
utilitarismo cria um padrão comportamental onde em alguns casos, são mais ou
menos agressivos, mas em outros, por demais violentos. Os altos índices de
criminalidade nos centros urbanos são a prova inconteste do que aqui se afirma
Outro desdobramento das sociedades que se organizam desta forma é a
determinação de padrões de comportamento, de constituição física (daí o aumento
dos transtornos alimentares, por exemplo), do belo e do feio, do bem e do mal, ou
seja, políticas maniqueístas do que deve e do que não deve ser aceito. Neste
universo, o bullying é mais um evento encontrado neste enquadramento.
1.2 OS
APELIDOS PEJORATIVOS As ofensas
repetidas, sob a forma de exposição ao ridículo por meio de apelidos
pejorativos, configuram mecanismo perverso de discriminação identificado na
literatura psiquiátrica e jurídica como modalidade de assédio moral 7. Foi
observado em uma pesquisa específica, que os apelidos pejorativos são
percentualmente os eventos de bullying mais frequentes entre jovens (Olweus,
1983), correspondendo a 52% do universo total dessas ações intimidatórias. Tal
constatação culminou na decisão de aprofundar o estudo destes dados em um formato
diferente, qual seja, o qualitativo. Essa metodologia permitiu uma análise mais
detalhada deste processo, visando a entender como crianças se sentem e lidam
com o apelido pejorativo. Esses apelidos são na opinião deste pesquisador, o
começo do bullying.
27ameaçando-os, perseguindo-os e
intimidando-os. Não são poucos os professores que, ao se referirem a alguns
alunos, usam os apelidos (que, às vezes, eles mesmos colocam), como Cascão,
Tampinha, Fantasminha, Lunático, Esquisito, Burraldo, fomentando assim, a
vitimização desses alunos (p. 98-69). Alguns professores não atribuem o uso de
apelidos como um aspecto relevante relacionado ao bullying, sendo que eles
próprios afirmaram que muitas vezes referem-se aos alunos dessa forma e também
aceitam apelidos que os alunos lhes colocam. Alguns pais também concordam com
esta postura, alegando que jovens, como num ritual de passagem, colocam mesmo
apelidos nos outros. Da mesma forma, introduzem-se na vida social adulta que
incluí comportamentos transgressores (Szymansky, 2008). Tendo em vista as
considerações acima, este estudo procurou verificar, o que os alunos sentem e
como reagem diante do apelido pejorativo recebido. Esses eventos levaram à
construção de inúmeras iniciativas para estudar e combater a prática de
bullying no Brasil e no mundo. No
Brasil, o Conselho Nacional de Procuradores-Gerais lançou uma campanha
educativa para combater o bullying nas escolas privadas e públicas do estado,
durante o I Fórum Paraibano Sobre Bullying Escolar e Incentivo à Cultura da
Paz, realizado no Centro de Convenções Cidade Viva, em João Pessoa e organizado
pela Curadoria da Infância e Juventude. Os temas debatidos foram Bullying
Escolar, Construção da Cidadania, Causas e Consequências do Fenômeno do
Bullying - Implicações Psicológicas, Jurídicas e Legislação Pertinente. Além desses fóruns, a ABRAPIA – Associação
Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à Adolescência – aparece
como centro de referência ao estudo e pesquisas sobre bullying.
28O Centro Multidisciplinar de Estudos e
Orientação sobre o Bullying Escolar-CEMEOBES, com sede em Brasília, foi criado
em maio de 2006, com o objetivo de disseminar uma Cultura de Paz e
Não-Violência. É uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público
(OSCIP), que se dedica exclusivamente ao estudo e orientação sobre o Bullying
Escolar, por considerá-lo questão de saúde pública, cujos prejuízos incidem na
aprendizagem, na socialização e na saúde emocional de crianças e adolescentes
envolvidos. Seu foco principal é atuar junto às instituições de ensino, para
que sejam capazes de identificar e intervir nas situações embrionárias de
Bullying e interromper seu processo reprodutivo e epidêmico, através de
estratégias promotoras da educação para a paz, da cidadania e dos direitos
humanos – Programa Antibullying – Educar para a Paz.
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2 comentários:
É um problema dos tempos modernos.
Não gosto muito de pensar nele, por ter um filho qiue ainda pode ser vítima. Felizmente até agora não foi, e espero que nujnca vneha a ser
Gostei
nice info,thankyouu!!
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